WATUSI#50ANOS chega ao palco do Theatro Net Rio
Maria Alice Conceição nasceu na comunidade do Caramujo, em Niterói. Aos três anos, atravessou a baía de Guanabara, e se mudou para o Rio de Janeiro, ao acompanhar a mãe que foi trabalhar como empregada doméstica em Copacabana. A menina sempre soube o que o futuro lhe reservava: ser estrela! Rebatizada como Watusi, agora, comemora 50 anos de carreira. Dessa vez, com uma apresentação, amanhã (segunda-feira, 13), no Theatro Net Rio, às 21h, com direito a participação especial dos músicos Wagner Tiso e Victor Biglione.
Ao longo de 90 minutos, Watusi apresentará um repertório com clássicos nacionais e internacionais como “Risque” (de Ary Barroso, a primeira canção que despertou nela o desejo de tornar-se cantora), “Pérola Negra” (Luiz Melodia), “Chiclete com Banana” (Gordurinha/Almira Castilho), “Non, Je ne Regrette Rien" (Edith Piaf), “Ne me quitte pas” (Jacques Brel) e “That`s what friends are for” (Burth Bacarath/Carole Bayer Sager), para citar algumas canções.
“Posso montar o repertório que for que sempre, no final, me cobram por não ter cantado essa ou aquela música, nacional ou estrangeira. Meu próximo espetáculo vai se chamar ‘Atendendo a Pedidos’. O pessoal vai sortear as músicas antes e eu canto”, comenta Watusi, entre gargalhadas, durante a entrevista concedida para o Comunic.
A artista conta que, na abertura do show, Old Simão que vai cantar “Watusi, pérola negra”, música composta para ela por Ricky Carvin, que mora nos Estados Unidos. Ela canta, no telefone, a sua canção.
“É difícil cantar uma música falando sobre você. Acho mesmo que é uma pretensão”, diz ela, emocionada.
Watusi, porém, nunca achou que Maria Alice fosse pretensiosa quando “teve convicção” que seria uma estrela. Ela acha que ser cantora faz parte do seu DNA: sua mãe Hermogênea “cantava muito” enquanto trabalhava e seu pai Aloísio, “quando precisava de algum dinheiro” corria para o programa de auditório, de Ary Barroso, na rádio.
Maria Alice preferiu arriscar a sorte nos programas de auditório da televisão. Foi “descoberta” pelo produtor Abrahão Medina, da TV Globo. O ano era 1969 e ela passou a frequentar estúdios de gravação. Tudo corria dentro da “rotina” quando o produtor musical Hélcio Milito olhou para ela e disse na lata: “com esse nome de Maria Alice você não vai a lugar nenhum”.
A jovem não se abalou. Sabe-se lá porque, ela estava lendo sobre uma tribo africana chamada Watusi, cuja característica era ser composta por pessoas muito altas. O mais baixinho, media quase dois metros. Aos 17 anos, ela já tinha o mesmo 1,74 m de altura que tem hoje. Estava claro para ela que era Watusi.
“É um nome estranho. Tinha que falar a toda a hora esse nome para assimilar e isso foi importantíssimo. A chave de tudo é acreditar e aproveitar todas as oportunidades”, afirma.
Mas houve uma oportunidade que Watusi simplesmente recusou a aproveitar porque achou que merecia algo melhor. Estamos falando da sua chegada ao Moulin Rouge, em Paris, quando a casa de espetáculos estava no seu auge, nas décadas de 70, 80.
Nessa época, a artista viajava o mundo como integrante da companhia Ballet Braziliana e sua performance no palco chamava cada vez mais atenção. Acabou sendo chamada para um teste no Moulin Rouge, mas jogou tudo para o alto quando descobriu que sua participação seria como coadjuvante que lhe permitiria ficar pouco mais de um minuto em cena. Em alto e bom som, avisou para o diretor do teste que só trabalharia na casa de espetáculos como estrela principal. Bateu em retirada, se juntou ao Ballet Victória de Barcelona e seguiu a vida.
Dois anos e meio depois, o big boss do Moulin Rouge, Jacki Clerico, correu para contratar Watusi depois de ver uma de suas apresentações. Ela adora contar essa história e a conta em detalhes. Principalmente no trecho em que Clerico dá um “piti” quando descobre que a futura estrela da sua casa de espetáculos já poderia ter sido contratada há tempos.
“Eu fui pretensiosa? Não. Isso é ter convicção do que você pode fazer. Ter um ideal é normal. Quando desisti do teste, muita gente me chamou de maluca, mas acabei sendo a única vedete a ter o nome em neon na fachada do Moulin Rouge. Valeu a pena”, conta ela que reinou na França até 1982, onde lançou moda ao usar como figurino um maiô super cavado e decotado - uma ousadia, na época - criado especialmente para ela pelo brasileiro José Moura.
C: Provavelmente, você foi muito assediada, nesta época. Como conviveu com isso?
W: Quando se está no palco, o assédio é normal. Você vira o sonho das pessoas. Eu poderia ter me casado com um milionário. Tive várias propostas, mas eu queria ser estrela. E o respeito, é você quem impõe. Pode me admirar, falar galanteios. Mulher gosta de ser elogiada. Só considero assédio se colocar a mão em mim. Aí, não.
C: E preconceito racial, nunca sofreu?
W: Eu prefiro não empacar na dificuldade. Uma vez, fiz um show no clube Fluminense, no Rio de Janeiro. Quando terminou, perguntaram se eu queria conhecer as instalações. Em um determinado ponto, o porteiro mulato me barrou, não me deixou passar. Achei estranho, mas larguei para lá. Muitos anos depois, uma determinada diretoria me pediu desculpas pelo episódio. Outra vez, eu já fazia sucesso na Europa e tive que vir ao Brasil porque minha mãe estava doente. Fiquei hospedada em Copacabana, no apartamento do Aguinaldo Timóteo. Resolvi fazer as unhas e entrei no primeiro salão que vi perto da casa dele. Uma moça mulata clara disse que a dona não atendia gente da minha cor. Virei as costas e voltei para casa. Aguinaldo estranhou eu ter feito as unhas tão rápido. Contei para ele o que tinha acontecido e ele ficou enfurecido. Me pegou pelo braço e praticamente me arrastou até o salão. Lá, ele fez um escândalo. Contou quem eu era, que eu tinha mais dinheiro que todas ali, que eu tinha dinheiro para comprar o salão, se eu quisesse. E exigiu que fizessem as minhas unhas. Fizeram. Essas coisas acontecem, mas não me prendo a elas.
Com o final do contrato no Moulin Rouge, Watusi achou que era hora de voltar para casa. No Brasil, ficou em cartaz de 1983 a 1987 no Scala Rio, período áureo da casa de espetáculos comandada por Chico Recarey. Foi ao vê-la nesse palco, que o ator Robert De Niro se apaixonou.
É com carinho e tranquilidade que Watusi relembra a história desse romance, mantido em segredo, segundo ela, para facilitar a vida de ambos. Quem atuou como “cupido”, ela conta, foi o cineasta Neville de Almeida. Durante dois anos, o casal viveu na ponte aérea Rio-Nova York. A artista diz que tudo foi “lindo enquanto durou” e que restou “amizade e respeito”.
Em outro momento, porém, o fim de um relacionamento nocauteou Watusi. Ela abriu a porta para a depressão e a convidou para entrar. Foram vários anos afastada dos palcos. A atual temporada, iniciada ano passado, por conta dos seus 50 anos de carreira, significa, também, sacudir a poeira e dar a volta por cima:
“Retornar precisa de mais coragem do que para começar. Você pode ficar no problema por um tempo, mas não o tempo todo. Você tem que ser forte, tem que se preprogramar”, comenta.
Na sua opinião, atualmente, ao mesmo tempo que é mais fácil chamar a atenção para o seu talento, por conta das redes sociais, por exemplo, há uma busca frenética por novidade, que faz com que as carreiras artísticas não tenham duração. Carreiras que, segundo ela, “não colam porque foram seladas com cuspi e não com cola”.
Um conselho? “Não pare!”:
“Oportunidades nem sempre aparecem. Quando isso acontecer, pega. É um cavalo correndo e você tem que pegar nem que seja pelo rabo. Tem sofrimento, mas se você parar, vão dizer que você não serve para nada e, nesse momento, eles terão vencido. Quando ouvir que você não serve, faça ouvido moucos. Dá uma de Alice”.
Serviço
WATUSI#50ANOS
Produção e direção geral: Rodrigo Zampronni (esquerda na foto) e André Auler (quarto, da esquerda para direita)
Maestro: Celso Santhana
Participação especial: Victor Biglione (direita) e Wagner Tiso (segundo, da esquerda para a direita)
Data: 13 de maio
Horário: 21h
Local: Theatro Net Rio: Rua Siqueira Campos, 143 - Copacabana, RJ
Ingresso: R$ 40,00 (meia)
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