'Niterói tem uma tradição vinculada ao samba que é muito importante', diz o historiador Luiz Antonio Simas, agora, cidadão niteroiense
- Sônia Apolinário

- há 8 horas
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No último sábado de 2025, Niterói passou a ter um novo cidadão. Com direito à medalha e diploma, o historiador, escritor e professor carioca Luiz Antonio Simas se tornou cidadão niteroiense em uma cerimônia realizada em uma espécie de representação informal de Niterói, no Rio: o Alfa Bar, no Centro da cidade.
Explica-se. O Alfa, pertinho das barcas, na Praça XV, é “território” de André Diniz, secretário de Economia Criativa e Ações Estratégicas de Niterói que, dentre outras coisas, promove mensalmente, o “Samba do André Diniz”. Simas é curador de eventos culturais do bar.
A homenagem a ele foi uma iniciativa do vereador Anderson Pipico (PT):
- O Simas, sua história, e todos os temas debatidos por ele são de interesse público, independente de cidade. Sou um profundo admirador do seu trabalho. Acredito ser um motivo de orgulho para Niterói ter uma figura como o Luiz Antônio Simas como cidadão niteroiense – afirmou o vereador.
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Simas é autor de mais de 30 livros – três deles frequentaram as listas dos mais vendidos, ao longo de 2025: “O corpo encantado das ruas”, “Umbandas: uma história do Brasil” e “Maldito invento dum baronete – uma breve história do jogo do bicho”.
Como professor, tem como sala de aula alguns botequins da cidade, o Alfa entre eles. E atrai multidões. Um público interessado em ouvi-lo falar sobre o que ele costuma chamar de “Cultura de Rua” da qual fazem parte o próprio botequim, além do samba, os terreiros e as esquinas da vida.

- Meu olhar (para Niterói) é para essa Niterói que tem uma tradição vinculada ao samba que é muito importante. Niterói é terra do Ismael Silva, que nasceu em Jurujuba. Niterói tem tradição vinculada a samba, a bloco, a escola de samba que é muito forte – disse o novo cidadão niteroiense, em entrevista exclusiva para o ComuniC.
Filho de um barbeiro e uma mãe de santo, Simas já foi tema de enredo de escola de samba (Acadêmicos da Abolição) e costuma assinar sambas de enredo de escolas. Só este ano, terá dois desfilando pelo Sambódromo do Rio; ano passado, dividiu a composição do enredo da Unidos da Tijuca com a cantora Anita, dentre outros co-autores.
Para 2026, ainda não consta da sua agenda uma aula pública em um bar de Niterói. Mas ele será convidado a vir à cidade para participar de uma audiência na Câmara dos Vereadores.
Isso porque Pipico apresentou um projeto de lei que busca o reconhecimento, pelo SUS, da efetividade dos tratamentos com ervas medicinais e o vereador pretende realizar uma audiência pública sobre o tema. Caso Simas confirme presença, uma coisa é certa: a Câmara vai virar sala de aula. Lotada.
Confira a entrevista
Como avalia ter se tornado cidadão niteroiense?
Luiz Antonio Simas: Trabalhei muito tempo em Niterói, dei aulas em Niterói. Um colégio privado, o pH, quando foi criado em Niterói, fui professor das primeiras turmas de História. Frequentei muito o Candongueiro (tradicional casa de samba no Rio do Ouro) . Já escrevi em um livro meu chamado “Samba de Enredo História e Arte” sobre a história dos sambas-enredo da Unidos do Viradouro e Cubango. Tenho uma relação com Niterói que é uma relação muito vinculada à cultura do samba. Além de ter trabalhado muitos anos como professor de História na cidade.
Como historiador ligado à cultura popular, que olhar tem para a cidade de Niterói?
LAS: Meu olhar é para essa Niterói que tem uma tradição vinculada ao samba que é muito importante. Niterói é terra do Ismael Silva, que nasceu em Jurujuba. Niterói tem tradição vinculada a samba, a bloco, a escola de samba que é muito forte. Cubango e Viradouro têm grandes sambas de enredo. Cubango, aquela região, representa para Niterói, pulsa para Niterói como a Pequena África pulsava no Rio de Janeiro. Então, é uma relação muito vinculada às culturas de rua, à cultura do samba, sobretudo, que é uma cultura da maior relevância.
Você já recebeu medalhas da Câmara do Rio de Janeiro por serviços prestados à cultura. Agora foi agraciado, também, com a Medalha Tiradentes. Como avalia esse tipo de homenagem?
LAS: Prefiro encarar essas homenagens como um reconhecimento pelo meu trabalho na área da Cultura. Tanto a medalha Pedro Ernesto, que já recebi, quanto a Tiradentes e o título de cidadão niteroiense, vejo, a rigor como uma homenagem não a mim, mas aos temas que eu estudo que é a cultura de rua, o samba, o botequim, as religiosidades afro-brasileiras, os terreiros, as esquinas. Quando eu sou contemplado com uma medalha desse tipo, prefiro acreditar, na verdade, que é o meu trabalho com a Cultura popular que está sendo homenageado. Por isso fico, evidentemente, muito agradecido.
Você já foi enredo de escola de samba. Como encara uma homenagem desse tipo?
LAS: Fui enredo da Acadêmicos da Abolição, escola de samba do grupo de Acesso, do Rio de Janeiro, e é extraordinário. Aí, eu diria que é, talvez, a maior das homenagens porque é uma homenagem que não é institucional, é orgânica, vem do chão da escola. É uma alegria enorme, mas, de novo, acho que não fui eu o homenageado, mas as coisas que eu escrevo, os temas com os quais trabalho, a cultura de rua. Isso é que é fundamental e acaba recebendo essa homenagem bonita no Carnaval.
Em 2026, dois sambas enredos da sua autoria vão desfilar no Sambódromo, não é isso?
LAS: Não sou exatamente compositor de samba-enredo. Eu faço, sobretudo, quando o enredo me atrai. Fui compositor do samba da Unidos da Tijuca (Grupo Especial) no Carnaval de 2025 porque o enredo me atraía muito, que foi Logun-Edé, um orixá muito importante [orixá filho de Oxóssi e Oxum na mitologia iorubá, símbolo da essência da juventude e da força das tradições]. Esse ano, recebi um convite da Paraíso do Tuiuti (primeira escola a desfilar na terça-feira de Carnaval pelo Grupo Especial), que escolheu um enredo que tem muita relação comigo, com a minha espiritualidade, que é sobre Ifá ["Lonã Ifá Lukumi” sobre uma vertente religiosa afro-cubana] e da Estácio (quinta escola a desfilar no sábado de carnaval pela Série Ouro). Fiz o samba da Estácio que também é um enredo que tem a ver comigo, sobre um grande sacerdote de umbanda do Rio de Janeiro, Tata Tancredo da Silva Pinto [“Tata Tancredo – O Papa Negro no Terreiro do Estácio”], que atuava no Rio, atuava em Niterói, que era de Cantagalo.
Niterói tem duas escolas de samba no Grupo Especial, em 2026. Alguma chance de compor samba enredo para alguma delas para o Carnaval de 2027?
LAS: Eu diria que o enredo que me atrai, o enredo é que me chama, sobretudo, os enredos com temáticas que considero mais apropriadas, até o tipo de composição que eu gosto de fazer, temáticas vinculadas às culturas populares, cultura de rua, terreiros, culturas afro-brasileiras de uma forma geral.
Em termos de cultural popular, como avalia o ano de 2025 no Rio de Janeiro?
LAS: As ruas continuam pulsando. Evidente que a gente tem políticas públicas que estimulam a Cultura e tem que ser assim, mas as ruas pulsam de uma forma que tem me agradado muito. É muita roda de samba e eu sou um sujeito muito vinculado ao samba. As rodas estão em tudo quanto é lugar, em Niterói, no Rio de Janeiro, no interior do estado. Eu fui a Campos dos Goytacazes e vi um movimento de roda de samba muito forte, contundente. Então, eu diria que a rua está viva e isso é que é fundamental. Porque isso implica em uma discussão sobre a cidade que a gente quer. A gente quer uma cidade entendida como um espaço de sociabilidade, de convívio, de encontro ou quer uma cidade pensada apenas a partir da lógica da circulação de capitais, da circulação de mercadorias, de corpos apressados para o trabalho? Acho que essa cultura do encontro, essa sociabilidade de rua que fundamentalmente faz com que o Rio de Janeiro pulse e isso é muito importante.
Que projetos pretende colocar na rua em 2026?
LAS: Para 2026, tenho ideias vinculadas a livros, continuar a dar aulas nas ruas, o interesse pela Cultura popular, a Cultura de rua continua forte, quero ver se concretizo isso em, pelo menos, mais um ou dois lançamentos de trabalhos que estou escrevendo e que acho que vou concluir em 2026.
































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