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  • Sônia Apolinário

Pioneiro na produção de cerveja artesanal, Pedro Ribeiro, agora, “produz” consumidores

No atual mercado da cerveja artesanal do Rio de Janeiro, consumidores como beija-flor bicam novidades e seguem seu voo, enquanto mais garrafas são colocadas à sua disposição. Na contramão deste movimento, um dos pioneiros da produção artesanal da cidade prefere investir no aumento dos beija-flores. Pedro Ribeiro, um dos criadores da Confraria do Marquês, local dos primeiros cursos cervejeiros do Rio, mira, agora, na “produção” de consumidores. Ele vai ao encontro do público nos pontos de venda e ministra oficinas “lúdicas”, com preços mais em conta. Faz isso dentro do projeto Escola Cervejeira Experimental, que participa ao lado de Francesca Sanci, Paulo Jr e Bruno Mesquita.

No próximo domingo (dia 8), por exemplo, vai ter aula e o tema é “Como e de que é feita a cerveja”. A oficina será realizada no bar Legião Carioca, em Botafogo, das 14h às 18h. Degustação e “dinâmica sensorial” fazem parte da “grade curricular” deste dia.

É dessa forma que ele pretende “criar pontes”, como costuma dizer, entre o consumidor e o mercado cervejeiro. Ou neutralizar o excesso de especialização que tomou conta desse ambiente e, na sua opinião, criou uma barreira que evita a aproximação de novos públicos.

“Vivemos um terceiro momento da cerveja artesanal no Rio de Janeiro. Há muita oferta para o público atual. É preciso criar pontes para atingirmos um público maior. O momento é de muita competição e disputa para um mercado pequeno. É preciso resgatar o sentido de união e cooperação do setor”, afirma ele que é consultor da cervejaria Big Head.

De acordo com Pedro, a união entre os cervejeiros foi a marca do segundo momento, um período que ele define como de “consolidação do mercado”, quando “todos se conheciam”. Isso foi por volta de 2014. Já o primeiro momento, segundo ele, teve como marca o pioneirismo e muita curiosidade, “onde todos aprendiam juntos”. Nessa época, o protagonismo ficou por conta da Confraria do Marquês, que ajudou a criar, em 2005, com um grupo de amigos.

Ele reconhece que “os pioneiros” tinham como foco o home brew e que nunca houve preocupação com formação de público. Na época do “segundo momento”, ele, particularmente, já tinha deslocado um pouco sua atenção para o ensino de elaboração de receitas. Além disso, começou a sentir falta de uma “certa profissionalização” do meio cervejeiro.

Em resposta a essa “intuição”, criou o projeto Cerveja da Casa, que tinha como objetivo aproximar os alunos das produções feitas em fábricas, de forma que tivessem contato com o processo como um todo: da produção à comercialização. Foi assim que 25 alunos-cervejeiros produziram um rótulo lançado no Mondial de la Bière de 2017: Samba-Enredo, uma Saison com cardamomo. Uma segunda edição do Cerveja da Casa está em maturação.

Tudo o que sei é que nada sei

E pensar que houve uma época que Pedro achava impossível fazer cerveja fora de uma grande fábrica. E pensar que houve uma época que ele passou vergonha por achar que “conhecia” cerveja.

Com muito bom humor, ele conta um episódio, que aconteceu em 1994, quando levou um amigo norte-americano a um evento cervejeiro, no Rio. Mais especificamente, a uma Oktoberfest, realizada no Riocentro, na Barra da Tijuca.

“Eu estava crente que estava agradando. Porém, quando meu amigo estava prestes a tomar o quarto chope, me perguntou se tinha outras variedades de cerveja. Eu não entendi. Afinal, tinha chope claro e escuro. Fiquei pensando o que mais ele poderia querer. Ele não reclamou. Só dois anos depois entendi o pedido que ele fez”, conta Pedro, divertido.

Em 1996, foi a vez do amigo se tornar anfitrião de Pedro. Ele levou o brasileiro para beber uma cervejinha no Wynkoop Brewing, em Denver (Colorado, EUA) – um brewpub instalado em uma casa de três andares, com várias torneiras de chope e enormes tanques fermentadores pelo salão. Para surpresa de Pedro, os equipamentos funcionavam de verdade, ou seja, não era apenas decoração. Surpresa ainda maior foi descobrir que tinha brewpubs parecidos a cada quarteirão da cidade.

Para completar a “humilhação”, o amigo norte-americano contou que fazia cerveja em casa e ofereceu uma das suas produções para o desconfiado Pedro experimentar. Ele aceitou por educação e, mais uma vez se surpreendeu. Agora, por constatar que uma bebida feita fora de uma grande fábrica podia ter qualidade.

Começar do zero

A temporada norte-americana de estudos de Design terminou em 2002. De volta ao Brasil, Pedro decidiu que continuaria próximo da craft beer. A questão é que, por aqui, não havia nem equipamentos para comprar, nem cursos para fazer. Literatura, segundo ele, só em alguns sites argentinos. O amigo Mauro Nogueira, que já tinha se “contaminado” pela cerveja artesanal, desde que visitou Pedro nos Estados Unidos, descobriu um curso em Juiz de Fora (MG) e foi fazer. Levou junto outro amigo em comum: Tiago Dardeau.

“Finalmente, conseguimos fazer nossa primeira cerveja. Quando abrimos e ouvimos o barulho foi emocionante. Fizemos uma Pale Ale e adoramos. Hoje entendemos que era uma cerveja bem ruim e que estava contaminada”, conta Pedro que foi “arrastando” mais amigos para a aventura cervejeira.

Além dele, Mauro e Tiago, faziam parte dessa “panelinha” Ricardo Rosa e Sergio Fraga. As brassagens eram feitas no condomínio onde Pedro e Mauro moravam, na rua Marquês de Olinda, em Botafogo - nome que serviu de inspiração para a Confraria do Marquês.

Não bastasse o pioneirismo em oferecer cursos de produção cervejeira, o grupo fundou uma associação que acabou por dar origem à AcervA Carioca. Era 2006 e estava aberto o período de realização de encontros entre “paneleiros”, o que era uma grande novidade.

Em pé (da esquerda para a direita): Mauro Nogueira, João Veiga, Márcio Sá, Leonardo Botto, Ricardo Rosa, Pedro Ribeiro. Agachados: Luís di Simeone (camisa preta à esquerda), Tiago Dardeau (camisa cinza), Sérgio Fraga (camisa preta à direita), Walter Souto (agasalho) e Júlio Bisneto (camisa branca). "Este é o ECCC, Encontro dos Cervejeiros Caseiros Cariocas que culminou com a fundação da AcervA. Foi realizado em maio de 2006 na churrasqueira do prédio onde moravam eu e o Mauro (meu compadre). Em novembro do mesmo ano foi fundada a AcervA Carioca e, em dezembro, foi realizado o primeiro encontro nacional da AcervA, na Ilha Primeira (Barra da Tijuca)."

Mais intuições

Em 2015, Pedro sai da Confraria, fecha sua agência de Design e faz da cerveja artesanal seu trabalho principal. Dois anos depois, começa o período que ele identifica como o “segundo momento” cervejeiro da cidade, quando um grupo mais jovem, muitos ex-alunos, se lança no mercado com o objetivo de “viver de cerveja”.

“Se a minha geração abriu portas, a nova geração consolidou o mercado e introduziu o conceito de cervejeiro cigano no Rio”, observa Pedro citando como expoentes desse momento as cervejarias Three Monkeys, 2cabeças, 3 Cariocas e Hocus Pocus.

O que, no “segundo momento” foi uma solução que facilitou a chegada ao mercado de novas cervejarias, Pedro identifica como sendo um dos problemas do momento atual: justamente a “vida” cigana.

“É um custo muito alto para ser cigano. A conta não fecha e isso não é bom para o negócio. Muitos cervejeiros trabalham em outros lugares para poder se manter e isso divide a atenção e a dedicação. É preciso criar parcerias para se livrar de ser cigano o tempo todo”, sugere Pedro. “Da panela para ser cigano é um grande passo que só funciona bem se é uma situação temporária. O cigano tende a acabar”.

Outra característica deste “terceiro momento” que, na sua opinião, não está fazendo muito bem para o mercado das artesanais é que “todos querem ser Hocus Pocus”. Traduzindo: muitas cervejarias chegam ao mercado com rótulos complexos e caros, logo de saída. Rótulos que Pedro entende que vão “brigar” pelo mesmo nicho de consumidores, que são os já iniciados na cerveja artesanal. Enquanto isso, observa ele, uma gama de outros consumidores fica “disponível” para ser “conquistado” por outros players desse mercado, como as indústrias de massa.

Diante desse quadro o que fazer para se lançar ou se manter, no mercado de cerveja artesanal do Rio de Janeiro? Pedro orienta deixar as panelas um pouco de lado e se lançar no desafio de montar um plano de negócio. O ponto de partida para isso, segundo ele, é fazer pesquisas de mercado, “com foco em custo e posicionamento”:

“É preciso identificar para quem vai vender o seu produto. Além disso, é preciso pensar também na parte comercial, na disponibilidade para fazer venda e pós-vendas. Geralmente, o cervejeiro só se preocupa com a produção da cerveja e se esquece de todo o resto”, comenta Pedro.

E quem já está no mercado, mas encontra dificuldade para vender sua cerveja?

“Observe onde você tenta vender sua bebida, como é a qualidade da sua equipe de venda e se é possível rever seu processo para baixar seu preço”, enumera.

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