Nova ameaça de desmoronamento de barragem coloca em risco polo cervejeiro de Minas Gerais
No final de semana passado (dias 16 e 17), moradores de Macacos, um charmoso arraial cercado de Mata Atlântica, em Minas Gerais, viveram momentos de pânico depois que sirenes tocaram alertando para o risco de rompimento da barragem da mina Mar Azul, também da Vale. Cerca de 200 pessoas foram evacuadas. Entre elas, Marcinho, o dono do bar que serve como sede do festival JungleBier, desde 2017. Macacos é o apelido de São Sebastião das Águas Claras, distrito da cidade de Nova Lima, distante 15 minutos de carro de Belo Horizonte, a capital mineira. Em Macacos, foi fundada, em 2015, a cervejaria São Sebastião, que integra a rota cervejeira de Nova Lima, que reúne mais de 20 marcas, Capa Preta, Koala e Verace entre elas.
No sábado, a partir das 18h40, alguns moradores passaram a receber telefonemas ou mensagens da Vale para que deixassem suas casas. Às 19h30, a primeira sirene soou. Eram todos moradores com casas ou estabelecimentos perto do rio Ribeirão Macaco, considerada área de risco pela mineradora. O bar do Marcinho e sua pousada ficam bem abaixo da represa criada pela barragem que acumula 3 milhões de metros cúbicos de rejeitos. No domingo pela manhã, a sirene foi acionada pela segunda vez.
“Levamos um grande susto e vivemos momentos de caos. Houve uma corrida de carros para sair da cidade e a passagem é bem pelo caminho da lama, caso a barragem se rompesse”, conta Augusto Franco, cervejeiro e sócio da São Sebastião.
Ele lembra que Mar Azul é o nome novo que a Vale deu para a mina Rio Verde cuja barreira
estourou, em 2001. Deixou um saldo de cinco mortos, todos funcionários da Vale – sendo que três corpos nunca foram encontrados sob a lama.
Parte dos moradores evacuados foi instalado em hotéis, em Belo Horizonte. Parte está em casa de amigos e parentes, em Macacos mesmo. Augusto explica que o lugarejo é íngreme, escondido entre duas reservas ecológicas, na confluência de três pequenos rios. Quem está nessa parte alta da cidade, segundo ele, não corre riscos, caso a barreira arrebente. A cervejaria está nesta parte alta.
Augusto afirma que, passados três dias que a sirene disparou pela primeira vez, os moradores continuam sem informações e orientações por parte da Vale. Também membro da associação comunitária, conta que a mineradora foi obrigada a “adotar um plano de emergência” porque o Ministério Público passou a exigir um atestado de segurança das barragens da empresa. A Vale, porém, não encontra engenheiro que queira assinar a papelada.
“Eles dizem que não houve alteração na barragem, que o problema é mais de documentação. Porém, ninguém está em paz. Não houve nada de concreto, mas os moradores estão com os cabelos em pé”, afirma Augusto.
Ex-jornalista, foi o desmoronamento da barragem de Mariana que o fez desistir da profissão. Na época, era subeditor do site do jornal O Tempo. Conta que, além do impacto que sofreu pela tragédia, em si, se revoltou ao acompanhar como “o governo puxava o saco da Vale”. O então cervejeiro de panela, que produzia sua bebida na garagem de casa, avaliou que o hobby poderia se tornar sua nova profissão. O projeto saiu do papel com a chegada dos sócios Daniel Ballesteros e Pedro Pereira.
Durante um ano, a São Sebastião foi cigana. Em 2016, a fábrica foi inaugurada. Para este ano, a meta é abrir o bar. Na sexta-feira, véspera da primeira sirene, rolou brassagem. O “impacto das sirenes”, ele acredita que começará a sentir a partir de hoje, terça-feira, dia em que os pedidos dos bares começam a chegar. Com produção entre 8 e 9 mil litros por mês, a São Sebastião prioriza a venda da cerveja em chope. Até o momento, colocaram 13 receitas no mercado cuja principal característica é o uso de produtos da região.
“Tem muita gente achando que todos fomos embora da cidade. Houve um grande alarmismo e não sabemos, de fato, o que está acontecendo. O DNA da cidade é o turismo e será complicado vir turistas para cá”, observa ele lembrando que, até então, eram boas as perspectivas para o carnaval.
Em caso de acidente, Augusto está convencido que todas as mais de 20 fábricas que formam a Rota Cervejeira de Nova Lima serão afetadas. O rio Ribeirão Macacos deságua no Rio das Velhas, responsável por 40% da captação de água de Belo Horizonte.
Nova Lima é uma das cidades mineiras com melhor qualidade de vida. O polo cervejeiro, que se concentra principalmente no bairro de Jardim Canadá, desempenha papel importante na economia e no turismo do município. Tanto que a prefeitura criou um selo cervejeiro para identificar as cervejas produzidas por lá. Capa Preta, Koala San Brew, Krug Bier e Verace são algumas delas.
“A Vale é uma empresa irresponsável. É cheia de processos e acordos. Todo mundo depende da água dos rios. Todos podemos ser afetados. Belo Horizonte pode ser afetada em questão de dias, em caso de acidente.É muito desrespeito”, afirma Augusto.
Cachoeira do Dantês Capela de São Sebastião
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