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  • Sônia Apolinário

Pesquisa relacionada ao cultivo do lúpulo brasileiro pode ser suspensa

Com a chegada dos meses de fevereiro e março, se aproxima a época da colheita do lúpulo brasileiro. Este ano, a safra tem uma peculiaridade: talvez não seja utilizada Além disso, as pesquisas relacionadas com o cultivo do lúpulo nacional correm o risco de serem interrompidas. O trabalho em desenvolvimento contava com o apoio da Brasil Kirin, comprada pela Heineken, em fevereiro do ano passado.

Quase um ano depois da sua chegada ao Brasil, a cervejaria holandesa não se pronunciou sobre os trabalhos relacionados com o desenvolvimento do lúpulo brasileiro, em fase de solicitação de registro da variedade junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Na prática, todos os envolvidos no projeto mantiveram seus trabalhos, sem saber se haverá ou não continuidade. Nessa situação estão produtores de oito cidades, escolhidas a dedo por terem condições climáticas diferentes. Todo esse cultivo ainda é considerado experimental e é monitorado. No total, são 4,5 hectares de terras plantadas com oito mil mudas de lúpulo batizado de Mantiqueira, que devem render uma safra de 700 quilos – atualmente, o Brasil importa cerca de duas mil toneladas de lúpulo, por ano.

“Não recebemos informações oficiais. Ainda nos comunicamos com os poucos funcionários da Kirin que foram mantidos na empresa, mas eles também não têm informações. A meta da Heineken é aumentar vendas. Eles são agressivos, comercialmente. Até agora, não se mostraram interessados no lúpulo brasileiro. Tudo indica que as pesquisas ficarão em segundo plano ou mesmo serão interrompidas”, afirma o engenheiro agrônomo Rodrigo Veraldi, principal responsável pelas pesquisas com o lúpulo Mantiqueira.

Ele é dono do Viveiro Frutopia, em São Bento do Sapucaí (SP),onde cultiva sete itens, dentre eles, framboesa, oliveira e parreira – ele produz vinho orgânico, um total de três mil garrafas por ano.

Desde 2005, Veraldi “persegue” a produção de lúpulos nacionais. Fez experimentos com 25 sementes canadenses, que não vingaram e foram parar na área de compostagem do sítio. Qual não foi sua surpresa quando, ali, surgiu uma planta: fruto de uma mutação genética, era um lúpulo adequado às condições da região, a Serra da Mantiqueira, resistente à chuva e fungos. Em março, o agrônomo fará sua sexta colheita do Mantiqueira, considerado, até agora, o lúpulo brasileiro.

A nipo-brasileira Brasil Kirin entrou nessa história em 2013, por intermédio da marca Baben Baden, do portfólio do grupo. Responsáveis pela cervejaria, que fica em Campos do Jordão (SP), distante cerca de 30 Km do sítio de Veraldi, foram até lá na tentativa de obter mudas de lúpulo para decorar a sede da marca.

“Conversamos sobre o trabalho que estava fazendo e eles se encantaram. A parceria foi nascendo. Cedi a licença de cultivo para eles que deram apoio às pesquisas, inclusive enviando flores para avaliação no Japão. A Kirin também iniciou o processo de registro da cultivare junto ao ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Foram criados os protocolos para cultivos monitorados. Esse trabalho tem um custo alto, que envolve muitos profissionais, inclusive, advogados”, explica Veraldi.

Na sua propriedade, meio hectare é reservado para a plantação do lúpulo. Por lá, são 40 dias de geada, por ano, e a temperatura chega a 14 graus negativos, no inverno. O clima seco impede formação de neve. No verão, a temperatura média é de 18 graus. A colheita do lúpulo leva 15 dias.

Os testes com o lúpulo Mantiqueira são feitos também nas cidades mineiras de Poços de Caldas, Águas de Lindoia, Piranguçu, Pouso Alegre e Rio Espera; e nas paulistas Tuiuti, Cruzeiro e Itu (onde fica o laboratório da Kirin).

Veraldi informa que algumas dessas plantações ainda vão colher a primeira safra, este ano. Segundo o agrônomo, o lúpulo brasileiro tem mais característica de sabor e aroma do que de amargor. O que ele planta, remete a maracujá doce, enquanto, em Águas de Lindoia, o aroma é de melão; em Cruzeiro, maçã verde e na quente Itu, algo mais picante, com um pouco de alho e especiarias.

O agrônomo também explica que os testes indicaram que o Mantiqueira já mostrou que

aguenta bem períodos longos de chuva. Isso, segundo ele, sinaliza que o lúpulo brasileiro também pode render bem em local seco, desde que com um bom sistema de irrigação.

“Já derrubamos várias questões que diziam ser impeditivas do Brasil ter lúpulo cultivado em larga escala como, por exemplo, a questão da quantidade de luz, que por aqui é diferente em comparação aos países do hemisfério norte. Também já deu para perceber que nossa variedade é resistente a fungos”, afirma Veraldi.

Os trabalhos dos produtores do Mantiqueira seguiram após a compra da Brasil Kirin pela Heinekein por conta de um contrato cuja vigência é outubro de 2018. O documento determina que a próxima safra, ou seja, a que começa a ser colhida em fevereiro, deverá seguir direto para a produção de mais um lote de Baden Baden Marzen (março, em alemão). Esse rótulo foi lançado no ano passado, sob o marketing de usar somente lúpulos brasileiros, na sua receita. Esse contrato, porém, foi firmado antes da fusão das cervejarias.

Tuiuti

No dia 10 de dezembro de 2016, João Carlos Oliano plantou, em Tuiuti (SP) sua primeira muda de lúpulo Mantiqueira. Proprietário de um salão de beleza e uma distribuidora, até então, ele se limitava a ser um apreciador e bebedor de cerveja.

Ao adquirir um terreno de família, decidiu que produziria “algo diferente”. Suas pesquisas em busca de um "produto original", o levaram ao lúpulo brasileiro. No total, plantou 500 mudas em uma área de três mil metros. Um investimento, até agora, de cerca de R$ 50 mil.

“A história do lúpulo brasileiro é muito bacana e eu quis participar. O maior desafio, para mim, é que não temos maquinário apropriado para essa produção. Acredito que é um campo a ser explorado comercialmente, mas com retorno de longo prazo”, afirma ele que, agora, já produz sua própria cerveja, em casa.

Na sua opinião, a Heineken “não está interessada” em dar prosseguimento ao projeto do lúpulo brasileiro. Ele acredita que, com isso, o trabalho pode “empacar um pouco”, mas seguirá “de alguma forma”.

O empresário se prepara para a colheita na segunda quinzena de fevereiro ou início de março. Tudo vai depender do volume de chuvas na sua região. De quanto será a safra, ele não sabe.

Para quem, como João Carlos, pretende se dedicar ao negócio do cultivo de lúpulo brasileiro, o agrônomo Rodrigo Veraldi informa que se trata de um cultivo “como qualquer outro”. Ou seja, dá trabalho, exige dedicação e conhecimento.

Para quem não é do ramo, ele avisa que o lúpulo é um produto perecível, que exige boa secagem e armazenagem, ou tudo se perde.

“Não temos maquinários adequados, ainda. Tudo é artesanal e empírico”, afirma ele que diz não ter recebido suporte da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). “O Brasil hoje tem o que caminha sozinho e o público que parou no tempo”.

Comunic Sônia Apolinário entrou em contato com a Heineken por intermédio da sua assessoria de imprensa. Apesar do retorno, não foram fornecidas informações sobre o tema desta reportagem.

São Bento do Sapucaí

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